A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) convidou todas as igrejas que tivessem sinos nos seus campanários, a tocá-los às 15 horas do último dia 11, Domingo da Misericórdia. Esse gesto já ocorreu outras vezes desde o início da pandemia. As situações difíceis da Covid-19 criaram uma avalanche de comunicação, multiplicaram-se lives, cursos, vídeos, podcasts, etc. Isso nos leva, inclusive, a questionar: diante de tanta tecnologia, para quê tocar sinos?
Para entender a dinâmica dos sinos é preciso voltar a um tempo com outras preocupações, em que a vida se regia de outro jeito, muito mais pela natureza e por atividades cotidianas mais monótonas do que por agendas repletas e incrivelmente diversificadas. Temos rastros destes tempos nas cidades pequenas do interior, ainda em alguns casos até agrárias, onde o povo está trabalhando pesado muito antes do sol nascer, onde o sino não incomoda se tocar cedo, mas pelo contrário, convida o povo a uma pausa, sendo inclusive festejado: “ufa, chega de trabalho, hora de rezar”.
Em tempos em que não se sonhava com anúncios instantâneos das redes sociais, cujos interesses são selecionados dentre os convenientes, o sino socializava as alegrias e dramas de uma comunidade, todos comunicados a quem conseguisse ouvir. E o quê se dizia com as badaladas?
Eram anunciadas as horas, mas não de modo simplesmente cronológico, havia uma comunicação religiosa: sempre lembradas as horas de rezar, especialmente 6 horas, o meio-dia e as 18 horas, momentos que a tradição cristã reservou para a oração do ângelus. Outra comunicação importantíssima era a dos sacramentos, em especial as missas, que contavam com “chamados”, que variavam de lugar para lugar. Sem contar os chamados para batismos, casamentos e, numa sociedade que tinha respeito mas não ojeriza à morte (por saber seu significado perante a fé) um chamado muito comovente era o chamado para as exéquias e velórios. Pelo toque do sino era possível saber, por exemplo, se quem morreu era um homem, uma mulher ou uma criança.
O sino era (mas teimo em dizer que é) símbolo de reunião, de vida comunitária, em que, de fato, a vida de todos importava. O sino era o diluidor das dores (chamava todo mundo para chorar junto, consolar), como nas catástrofes, mas também o difusor da alegria, como por exemplo na eleição de um novo papa.
Em alguns lugares de Minas Gerais e da Bahia, especialmente aqueles históricos que possuem várias igrejas próximas, há o curioso evento dos “combates” de sinos em que uma igreja desafia a outra a repetir os toques de modo semelhante. Um dos combates mais famosos é o das igrejas de Nossa Senhora do Pilar, Nossa Senhora do Carmo e São Francisco de Assis, que ocorre no quarto domingo da quaresma em São João Del Rey, Minas Gerais.
Engana-se quem pensa que a tradição dos sinos foi encerrada. Em nossa diocese, inclusive, há uma fábrica de sinos: a Sinos Angeli, localizada na cidade de Diadema, que fabrica sinos para todo o Brasil e até para exportação.
Vivemos um tempo em que infelizmente, nada está fácil, mas oremos para que em breve, quando do fim da pandemia, esse costume tão bonito possa ser sonhado por todas as comunidades. Em uma realidade tão urbanizada, cujo ritmo de vida foi bagunçado pela primazia econômica, que alterou muitos ritmos de vida, talvez chamados tão constantes sejam difíceis, mas ao menos o convite para algumas missas seria interessante. Para participar da vivência dos sinos não é necessária internet, energia elétrica, conexão, basta fazer parte da comunidade e estabelecer um vínculo com essa comunicação tão bonita. Oxalá todas as igrejas de nosso Brasil pudessem ter seus sinos, por mais simples que fossem.
Abaixo, seguem alguns significados das mensagens dos sinos conforme fontes dos estados do Rio Grande do Norte, do Ceará e de Minas Gerais. É preciso salientar que os toques em geral são tradições comunitárias, variando de um lugar para outro:
Chamando para a missa: doze badaladas (em homenagem aos apóstolos), seguidas de sete ou seis badaladas (se fosse o bispo a celebrar), cinco badaladas (se fosse um padre visitante) ou três badaladas (se fosse o pároco), além de um repique (toque com o sino parado) na hora da consagração e na elevação do cálice;
Procissões, novenas, batizados, confissões: dez badaladas;
Funerais: nota-se grande variedade de tradições: para homens: três dobres no sino grande; para mulheres: três dobres no sino pequeno; para crianças menores de sete anos: um repique, lembrando anjos que sobem aos céus. Na morte do papa: dobres de hora em hora; na morte do bispo: a cada três horas; na morte do pároco: a cada quatro horas e na morte de outro padre que tenha servido na paróquia ou outro sacerdote da diocese: a cada seis horas. No caso dos clérigos, os dobres se alternavam entre o sino grande e o pequeno, doze ou catorze para o papa, dez para o bispo e sete para os padres;
Catástrofes: toques desordenados, significando o tumulto.
Source: Diocese