A inteligência é expressão da dignidade que foi dada pelo Criador, que nos fez à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 26) e nos tornou capazes, através da liberdade e do conhecimento, de responder ao seu amor. A Bíblia atesta que Deus deu ao ser humano o seu Espírito a fim de terem «sabedoria, inteligência e capacidade para toda a espécie de trabalho» (Ex 35, 31). Isto manifesta-se de modo particular na ciência e na tecnologia, que são produtos extraordinários do seu potencial criativo.
O progresso da ciência e da técnica leva ao aperfeiçoamento do homem e à transformação do mundo. E isto é bom. Porém, o progresso das novas tecnologias da informação, sobretudo na esfera digital, apresentam oportunidades mas também riscos, com implicações na busca da justiça e da harmonia entre os povos.
Os novos instrumentos digitais estão mudaram a fisionomia das comunicações, da administração pública, da instrução, do consumo, dos intercâmbios pessoais e de inúmeros outros aspetos da vida diária. Os progressos da informática, o desenvolvimento das tecnologias produzem transformações na sociedade global e suas dinâmicas. A inteligência artificial chegou para ficar. Como será o mundo com ela?
Esta questão é colocada pelo Papa Francisco na sua “Mensagem para o Dia Mundial da Paz”, comemorado em 1º de janeiro de cada ano, e que aqui refletimos.
A inteligência artificial é uma galáxia de realidades diversas. Não podemos presumir a priori que o seu desenvolvimento traga um contributo benéfico para o futuro da humanidade e para a paz entre os povos. O resultado positivo só será possível se nos demonstrarmos capazes de agir de maneira responsável e respeitar valores humanos fundamentais como «a inclusão, a transparência, a segurança, a equidade, a privacidade e a fiabilidade».
A imensa expansão da tecnologia deve ser acompanhada por uma adequada formação da responsabilidade pelo seu desenvolvimento. A liberdade e a convivência pacífica ficam ameaçadas, quando os seres humanos cedem à tentação do egoísmo, do interesse próprio, da ânsia de lucro e da sede de poder. Por isso temos o dever de alargar o olhar e orientar a pesquisa técnico-científica para conseguir a paz e o bem comum, ao serviço do desenvolvimento integral do homem e da comunidade.
A inteligência artificial tornar-se-á cada vez mais importante. Os desafios que coloca não são apenas de ordem técnica, mas também antropológica, educacional, social e política. Ela deve ser colocada a serviço da paz e nunca da guerra. A inteligência artificial deveria estar ao serviço dum melhor potencial humano e das nossas mais altas aspirações, e não em competição com eles.
Isto deve fazer-nos refletir sobre um aspecto esquecido frequentemente na atual mentalidade tecnocrática, mas decisivo para o desenvolvimento pessoal e social: o «sentido do limite». Com efeito o ser humano, mortal por definição, pensando em ultrapassar todo o limite mediante a técnica, corre o risco, na obsessão de querer controlar tudo, de perder o controle sobre si mesmo. Na busca duma liberdade absoluta, pode cair na espiral duma ditadura tecnológica.
Reconhecer e aceitar o próprio limite de criatura é condição indispensável para que o homem alcance ou, melhor, acolha a plenitude como uma dádiva. Ao passo que, no contexto ideológico dum paradigma tecnocrático animado pela autossuficiência, as desigualdades poderiam crescer sem medida, e o conhecimento e a riqueza acumular-se nas mãos de poucos, com riscos para as sociedades democrática e uma coexistência pacífica.
No início do novo ano, peçamos que o rápido desenvolvimento de formas de inteligência artificial não aumente as já demasiadas desigualdades e injustiças presentes no mundo, mas contribua para pôr fim às guerras e conflitos e para aliviar muitas formas de sofrimento que afligem a família humana.
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