
O primeiro Jubileu (ou Ano Santo) da história ocorreu no ano 1300 d.C., proclamado pelo papa Bonifácio VIII (1235-1303). O fato permanece rodeado de muitas questões por parte dos historiadores, mas ao que tudo indica, o papa foi impelido à decisão pela solicitação de grupos de fiéis que acorreram em grande número a Roma naquele ano, pois tinham “ouvido dizer pelos antepassados que cada cristão que visita o corpo dos apóstolos durante um ano centenário é liberado seja das culpas que das penas” (VINCENT, 1996, p.61). Anteriormente ao pontificado do Papa Caetano, poucas alusões se encontram em autores cristãos da tarda antiguidade e da Idade Média. Santo Ambrósio, em sua obra Apologia Prophetae David faz alusão ao jubileu hebraico. Contudo, o Ano Santo institucionalmente organizado não se verifica no período antigo e na alta Idade Média. Ao que tudo sugere, os movimentos de peregrinação surgidos no seio da cristandade – inclusas as Cruzadas – fizeram propagar a ideia de que dirigir-se a Roma nos anos centenários do nascimento de Cristo, permitiria aos cristãos alcançarem indulgências plenárias, como um século antes já se tinha verificado, segundo ideias que se propagavam. A ideia teria encontrado forte eco em Bonifácio VIII que inclusive solicitara uma ampla pesquisa nos arquivos eclesiásticos, sem que, contudo, se encontrassem indícios documentados de um jubileu com concessões de indulgências no ano 1200 d.C. A passagem do século XIII para o século XIV foi marcada pelo forte clima tensão escatológica surgida com a propagação das ideias de Joaquim de Fiore (1135-1202) por obra dos assim denominados “espirituais franciscanos”. Havia um forte milenarismo associado ao advento da Era do Espírito Santo. O papa demonstrou-se favorável aos anseios dos fiéis que, de toda a cristandade chegavam à cidade de Roma para as celebrações mais importantes e para as visitas às Basílicas Apostólicas de São Pedro e de São Paulo. A Bula Antiquorum habet fida relatio, data de 22 de fevereiro de 1300 e dá as orientações para a obtenção da indulgência plenária: aos romanos, trinta visitas consecutivas às Basílicas e, aos peregrinos estrangeiros, quinze, após arrependimento dos pecados e confissão sacramental.
Bula Antiquorum habet, de Bonifácio VIII, 22 de fevereiro de 1300, primeiro jubileu da história
Sem dúvidas esse evento representou um impulso aos movimentos de peregrinações, especialmente a Roma. O Ano Santo era entendido como um tempo de graça para a reconciliação, pela experiência da misericórdia divina. Naquele tempo, a visita aos túmulos dos apóstolos foi equiparada aos mesmos privilégios espirituais dados a quem visitasse a Terra Santa. A ampla concessão das indulgências por ocasião do jubileu, por um inteiro ano, de um Natal a outro, fundava-se na compreensão teológica ligada ao princípio de um inexaurível tesouro de méritos acumulado por Cristo e por todos os santos. Tal prática correspondia diretamente à doutrina penitencial dos doutores da escolástica. Inicialmente previa-se um intervalo de cem anos para a realização dos jubileus. Contudo, o grande fluxo de pessoas e o anseio pelo tempo do “grande perdão”, para não privar as gerações de tão grande privilégio, estabeleceu-se o período jubilar de cinquenta em cinquenta anos. Nesse sentido, o segundo jubileu foi proclamado em 1350 e, nessa ocasião, foi acrescentada a obrigatoriedade de visitação também à Basílica de São João de Latrão. O papa, à época Clemente VI (1291-1352), vivia em Avignon, na França, não se fez presente em Roma, mandando legados que o representassem. Eram anos marcados por guerras (Cem Anos) e epidemias (Peste Negra), mas esses percalços não impediram as peregrinações. Com o chamado “Grande Cisma do Ocidente” (1378-1417), o Jubileu de 1400 ocorreu em meio aos conflitos entre as obediências de Roma e de Avignon. O Papa Urbano VI (1378-1389) desejou restringir os jubileus à periodicidade de 33 anos em referência à vida terrena de Jesus. Sua esperança era, com um jubileu previsto para 1383, resolver o problema do cisma que se havia estabelecido. Em 1383 não ocorreu um jubileu que, pelo próprio Urbano VI, foi prorrogado para 1390. O novo papa, Bonifácio IX (1389-1404), celebrou o referido Ano Santo, estabelecendo, pela primeira vez, a obrigatoriedade de visita às quatro Basílicas Maiores de Roma. Dez anos depois, um novo Ano Santo celebrava-se sem que, contudo, chegasse ao fim o grande cisma. Ao jubileu de 1400 uniram-se em grande número os adeptos da companhia ou confraria “dei Bianchi (brancos)”, ou seja, leigos penitentes que, organizados em irmandades e vestindo túnicas brancas, ficaram assim apelidados, a tal ponto que aquele jubileu fico conhecido como “o jubileu dei Bianchi”.